Atenção, o seu browser está desactualizado.
Para ter uma boa experiência de navegação recomendamos que utilize uma versão actualizada do Chrome, Firefox, Safari, Opera ou Internet Explorer.

Uma “moratória” para os contratos de seguro

PUBLICAÇÕES SÉRVULO 21 Mai 2020

O Decreto-Lei n.º 20-F/2020 de 12 de maio, contém um regime excecional e temporário relativo ao pagamento do prémio de seguro e aos efeitos da diminuição temporária, total ou parcial, do risco da atividade no contrato de seguro, o qual vigora até 30 de setembro de 2020.

No que diz respeito ao pagamento do prémio de seguro, o Decreto-Lei n.º 20-F/2020 limita temporariamente o regime de resolução automática do contrato por falta de pagamento do prémio previsto no artigo  61.º do regime jurídico do contrato de seguro, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 72/2008, de 16 de abril, ao determinar que o mesmo passa a ter natureza de imperatividade relativa, podendo ser convencionado entre o segurador e o tomador do seguro um regime mais favorável a este último.

O Decreto-Lei n.º 20-F/2020 enumera de forma exemplificativa algumas possibilidades mais favoráveis ao tomador do seguro, tais como o diferimento do pagamento do prémio para data posterior à do início da cobertura dos riscos, o fracionamento do prémio, a prorrogação da vigência do contrato de seguro, a suspensão temporária do pagamento do prémio e a redução temporária do montante do prémio em função da redução temporária do risco do tomador do seguro.

Na ausência de acordo e tratando-se de seguro obrigatório, determina o Decreto-Lei n.º 20-F/2020 que, em caso de falta de pagamento do prémio ou fração na data do respetivo vencimento, o contrato é automaticamente prorrogado por um período de 60 dias a contar da data do vencimento do prémio ou da fração devida.

O Decreto-Lei n.º 20-F/2020 prevê ainda um regime especial aplicável aos tomadores de seguros cujas atividades foram afetadas por força das medidas excecionais e temporárias adotadas em resposta à pandemia da doença COVID-19, quer por encerramento dos respetivos estabelecimentos ou instalações, quer por redução substancial resultante do impacto direto ou indireto dessas medidas. Para estes efeitos, considera-se existir redução substancial da atividade quando o tomador de seguro esteja em situação de crise empresarial, nomeadamente por registar quebra abrupta e acentuada de, pelo menos, 40 % da faturação.

Os tomadores de seguro que se encontrem na situação prevista pelo Decreto-Lei n.º 20-F/2020 poderão solicitar aos seguradores o reflexo das circunstâncias atuais nos seguros que cubram riscos da atividade, aplicando-se com as necessárias adaptações, o regime de diminuição do risco (e do prémio respetivo) constante do artigo 92.º do regime jurídico do contrato de seguro. Os tomadores de seguro poderão ainda requerer o fracionamento do pagamento dos prémios referentes à anuidade em curso, sem custos adicionais. Este regime não é, no entanto, aplicável aos seguros de grandes riscos.

A prorrogação automática por defeito do contrato de seguro obrigatório, em caso de falta de acordo entre tomador de seguro e segurador quanto às medidas a aplicar, representa em termos práticos, para o tomador de seguro, um diferimento da obrigação de pagamento do prémio de seguro. O tomador de seguro sujeito a dificuldades de tesouraria em face da redução substancial da sua atividade beneficiará assim de um período adicional em que mantém a plena cobertura do seguro obrigatório, permitindo-lhe recuperar a sua situação económica e proceder ao pagamento do prémio do seguro até ao final do prazo de diferimento, obstando à resolução do contrato. Diga-se, no entanto, que a formulação abrangente desta medida significa que a mesma se aplica a todos os contratos de seguro obrigatório no âmbito dos quais ocorra a falta de pagamento do prémio ou fração na data do respetivo vencimento, durante a vigência do Decreto-Lei, ainda que o respetivo tomador de seguro não se encontre em situação de redução substancial da atividade.

As medidas excecionais a aplicar por acordo entre tomador de seguro e segurador, quer no que diz respeito ao pagamento do prémio de seguro, quer no que diz respeito à alteração do risco da atividade, são enumeradas de forma sumária e exemplificativa no presente Decreto-Lei, não permitindo, para já, uma avaliação completa dos seus efeitos potenciais. A experiência havida no contexto do setor bancário com a aplicação da moratória para contratos de crédito celebrados com clientes bancários indicia que este género de medidas é suscetível de gerar dúvidas e interpretações díspares na sua aplicação. Neste contexto, a preconizada densificação dos deveres dos seguradores previstos no Decreto-Lei, por norma regulamentar da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF), será da maior importância para a plena e eficaz aplicação das medidas ora previstas.

Patrícia Costa Gomes | pcg@servulo.com