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RRGA finalmente publicado: O novo Regulamento da CMVM relativo ao Regime de Gestão de Ativos

PUBLICAÇÕES SÉRVULO 05 Jan 2024

1. Aspetos gerais

Na sequência de um processo de consulta pública muito participado e de um longo período de finalização, a CMVM aprovou finalmente o Regulamento n.º 7/2023 (Regulamento do Regime de Gestão de Ativos ou RRGA), que desenvolve regulamentarmente e complementa o Regime de Gestão de Ativos.

Como linhas gerais do diploma, interessa reter que o RRGA, em linha com o RGA, unifica o tratamento dos organismos de investimento coletivo (OIC) em geral e dos OIC de capital de risco, revogando os Regulamentos 2/2015 e 3/2015 que antes disciplinavam separadamente as figuras. Neste processo de consolidação normativa, nota-se uma clara diminuição de especificidades do capital de risco, apenas detetadas nas regras de reporte informativo (Anexo IX), adequação da denominação do OIC à política de investimento (art. 13.º, n.º 6 b) e modo de divulgação de erros imputáveis à gestora (art. 77.º, n.º 8). 

2. Regime de autorizações

No que respeita ao processo de autorização de início de atividade das sociedades gestoras de OIC, o RGGA reflete o compromisso de simplificação do processo autorizativo e de redução dos elementos instrutórios assumido no RGA, baseando-se num novo paradigma de supervisão ex post e de responsabilização dos requerentes pela continua observância do quadro legal aplicável.

Nesse sentido, em complemento aos elementos previstos no Anexo I do RGA, o artigo 3.º do RGGA contempla o conjunto de elementos adicionais a submeter à CMVM com o pedido de autorização para início de atividade da generalidade das SGOIC, independentemente do respetivo segmento específico de atividade (SGOIC ou SCR) ou da sua dimensão (grande ou pequena, consoante o montante dos ativos sob gestão).

Assim, e por contraposição ao previsto no artigo 1.º-A do revogado Regulamento da CMVM n.º 2/2015, muito embora se mantenha a obrigatoriedade de apresentação de um organograma e da descrição organizacional da sociedade gestora, incluindo a indicação dos recursos afetos a cada departamento, a CMVM prescinde da receção de informação acerca dos meios humanos, materiais e técnicos a afetar à atividade, bastando a descrição da estrutura organizacional da SGOIC indicando os recursos afetos a cada departamento. Prescinde-se também do envio de projetos de políticas e procedimentos internos. O conteúdo do programa de atividades, que continua a dever ser apresentado, deixa de ser alvo de regulamentação. Mantém-se, no entanto, a obrigatoriedade de envio de código de acesso à certidão permanente de registo comercial ou certificado de admissibilidade de firma da sociedade, consoante a SGOIC se encontre ou n constituída, bem como de um mapa discriminativo de fundos próprios e de informação respeitante aos membros do órgão de administração (limitada à sua qualidade executiva ou não executiva, distribuição de pelouros e disponibilidade) e ao responsável de verificação do cumprimento (neste caso unicamente sobre a sua  identidade, experiência e disponibilidade).

Em matéria de alterações subsequentes à autorização para início de atividade das DGOIC, e tendo por referência o disposto no art.º 1-C do Regulamento n.º 2/2015 da CMVM, o art.º 4.º do RRGA contempla ainda a identificação das alterações consideradas “substanciais” e “não substanciais” às condições de autorização, limitando o elenco das primeiras à ocorrência de um conjunto limitado de eventos (i) as alterações em matéria de estrutura da administração e de fiscalização que impliquem a adoção de um modelo de fiscalização menos reforçado; (ii) alteração do responsável pela verificação do cumprimento (e não as alterações relativas à generalidade dos responsáveis pelas funções-chave anteriormente integradas no conceito); (iii) as alterações que tenham por efeito a redução de fundos próprios; ou (iv) a redução de capital. Também com o propósito de simplificação de procedimentos, para comunicação das alterações sujeitas a registo comercial passa a bastar o envio do código de acesso à certidão permanente do registo comercial.

Especificamente no que respeita às sociedades gestoras de OIAs, prevê-se ainda a obrigatoriedade de comunicação à CMVM da pretensão de constituição de OIA de tipo ou com estratégia de investimento diferente dos adotados até à data com uma antecedência de 30 dias face ao início da comercialização do primeiro OIA. Esta comunicação deve ser acompanhada de um programa de atividades atualizado bem como de evidência de que a sociedade gestora dispõe de meios técnicos e humanos adequados para o efeito (art.º 4.º, n.º 5).

Relativamente aos pedidos de autorização para realização de operações de fusão e cisão que envolvam SGOIC, o artigo 5.º do RGGA evidencia uma diminuição dos elementos instrutórios anteriormente exigíveis para o mesmo efeito pelo artigo 1.º - D do Regulamento da CMVM n.º 2/2015, deixando de ser necessário apresentar informação relativa: (i)  ao contexto, fundamentação e repercussões da fusão para clientes e participantes; (ii) calendário da fusão (apenas se exigindo a previsão da data expectável para a produção de efeitos); e (iii) projetos de comunicações a dirigir aos clientes  bem como comprovativos de deliberações.

No domínio dos OICs, o RGGA limita-se a complementar a definição do conceito de “alterações substanciais” ,previsto no artigo 27.º do RGA, bem como a definir as circunstâncias que determinam a verificação de uma alteração significativa às politicas de investimento, incluindo de endividamento, de distribuição de rendimentos, bem como do prazo de calculo ou divulgação do valor das unidades de participação, sem alterações a apontar face ao previsto nos artigos 92.º a 94.º no Regulamento da CMVM n.º 2/2015.

3. Atividade da sociedade gestora

Por seu turno, no Título IV consagrado à “Atividade da Sociedade Gestora” o RRGA fixa regras referentes a duas dimensões dessa mesma atividade: a “Organização e Exercício” e a “Comercialização”.

No Capítulo referente à primeira dimensão encontram-se três artigos com características distintas. Por um lado, os dois primeiros assumem um caráter essencialmente clarificador e remissivo, pois remetem para as regras relativas a registo de clientes – essencialmente as que resultam da Lei n.º 83/2017, de 18 de agosto (cf. artigo 75.º do RRGA) – e para as normas contabilísticas aplicáveis (cf. artigo 76.º do RRGA). Por outro lado, o já existente regime de responsabilidade da sociedade gestora é essencialmente objeto de uma depuração de redação e da inclusão de referências à especificidade dos OIA de capital de risco fechados (cf. artigo 77.º do RRGA).

No que se refere à densificação do regime da comercialização, o RRGA procede à regulamentação dos aspetos que eram já objeto de densificação no Regulamento da CMVM n.º 2/2015, no entanto, em linha com o próprio RGA, verifica-se uma intenção de simplificação e contenção reguladora. No plano da simplificação, assume relevo o facto de se eliminar, por redundância com o regime resultante do próprio RGA, a referência ao tratamento equitativo dos participantes (cf. artigo 80.º do RRGA). No vetor da contenção reguladora destaca-se, por comparação com o regime pretérito, a limitação dos requisitos impostos ao conteúdo do contrato de comercialização, ficando agora tal conteúdo essencialmente na esfera decisória das partes (cf. artigo 79.º do RRGA). 

4. Prestação de informação

Para efeitos do cumprimento do dever de elaborar o prospeto e o regulamento de gestão, o RRGA veio estabelecer a obrigatoriedade de elaboração de um documento único padronizado, aplicável a i) OIC abertos que não se dirijam exclusivamente a investidores profissionais, ii) OIC fechados objeto de oferta pública, e iii) OIC fechados que não se dirijam exclusivamente a investidores profissionais, nem sejam objeto de oferta pública e cujo valor mínimo de subscrição, por investidor, seja inferior a € 100 000 . Nos demais casos, nomeadamente quando se trate de OIC dirigidos a investidores profissionais e de OIC fechados que não cumpram as características anteriormente mencionadas, não existe a obrigação de o regulamento de gestão do OIC ser elaborado de acordo com o modelo padronizado de documento único.

O RRGA determina a obrigação de a sociedade gestora de OIC, quando aplicável, atualizar no documento único a taxa de encargos correntes (até 10 dias úteis após o dia 30 de abril de cada ano) e o indicador sintético de risco e de remuneração e o indicador sumário de risco (sempre que atualize estes indicadores no IFI e no DIF, respetivamente).

O conteúdo do documento único deverá incluir uma referência ao indicador sintético de risco e de remuneração previsto no artigo 58.º do RRGA ou ao indicador sumário de risco e respetiva explicação prevista no Regulamento Delegado 2017/653, tendo-se em vista a clarificação da regra a seguir na divulgação do indicador de risco, consoante seja elaborado e divulgado o IFI ou o DIF. Além disso, no caso de OIC aberto que não se dirija exclusivamente a investidores profissionais passa a exigir-se a inclusão, na parte do documento único relativa a custos e encargos, de uma tabela relativa à Taxa de Encargos Correntes suportados pelo OIC . De salientar ainda previsão, no documento único, de um capítulo que deverá refletir outras informações legais relativas a cada OIC em concreto que devam constar dos documentos constitutivos do OIC, assim como outras informações que possam ser consideradas relevantes para os participantes (por exemplo, as condições relativas a aumento e redução de capital de OIA fechado e a possibilidade do regulamento de gestão do OIA fechado ser alterado sob proposta dos participantes).

Relevante ainda é a profunda reorganização do acervo de deveres de reporte de informação à CMVM a cargo das sociedades gestoras de OIC operada pelo RRGA, concentrando-se tais deveres no artigo 83.º do RRGA. O mencionado preceito inclui o Anexo VI do RRGA, que estabelece um quadro sistematizador dos deveres de reporte de informação, organizado por 5 temas, cada tema correspondendo a um anexo autónomo do RRGA, a saber: valores mobiliários e ativos financeiros e não financeiros (Anexo VII), imobiliário (Anexo VIII), capital de risco, créditos e OIA que não invistam predominantemente em determinado tipo de ativos (Anexo IX), comercialização de OIC estrangeiros em Portugal (Anexo X), sociedades gestoras (Anexo XI).

Em linha com a possibilidade introduzida pelo RGA de uma sociedade gestora de pequena dimensão dedicar-se, a título acessório, ao investimento para carteira própria, o RRGA introduz um dever a cargo destas sociedades de reportarem à CMVM a composição da respetiva carteira, nos termos da Secção IV do Anexo XI.

Por fim, destaca-se ainda o novo dever das sociedades gestoras de OIC de comunicarem à CMVM, logo que possível e no prazo máximo de 24 horas, a ocorrência de incidentes relacionados com a segurança da informação e comunicação que impactem o normal funcionamento da sua atividade, ou que constituam risco elevado para aquele funcionamento.

 5. Entrada em vigor

O RRGA entrou em vigor em 1 de janeiro de 2024. As sociedades gestoras e os organismos de investimento coletivo abrangidos pelo RRGA dispõem de um prazo de 180 dias, após a sua data de entrada em vigor, para se adaptarem ao mesmo.

Inicia-se agora um período de análise atenta do novo Regulamento, para procurar preparar, planear e executar uma estratégia de adaptação por parte de cada sociedade gestora.

  

Paulo Câmarapc@servulo.com

Verónica Fernandezvf@servulo.com

José Guilherme Gomesjgg@servulo.com

Andreea Babiceanaba@servulo.com