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Novas alterações à Diretiva relativa aos Gestores de Fundos de Investimento Alternativo (“AIFMD”)

PUBLICAÇÕES SÉRVULO 25 Jan 2022

No âmbito do pacote de medidas para implementar a União dos Mercados de Capitais, a Comissão Europeia divulgou, no dia 25 de novembro de 2021, uma Proposta de Diretiva (“Proposta”), que introduz alterações à Diretiva 2011/61/UE (“Diretiva AIFMD”), relativa aos Gestores de Fundos de Investimento Alternativo (“GFIA” e “FIA” respetivamente).

A Proposta introduz alterações no que respeita às atividades que podem ser desempenhadas pelos GFIA, à subcontratação ou delegação de funções, gestão do risco de liquidez, serviços de depositário e concessão de empréstimos por FIA.

1. Atividades e Serviços

Nos termos da Proposta, são alargadas as atividades que podem vir a ser desempenhadas e os serviços que podem vir a ser prestados pelos GFIA, acrescentando-se as atividades de concessão de crédito (“loan originating”) e serviços relacionados com veículos de titularização (“servicing securitisation special purpose entities”) (Anexo I, pontos 3 e 4), bem como os serviços de administração de índices de referência e a prestação de serviços de gestão de crédito (artigo 6.º, n.º 4).

2. Meios humanos

Em termos de direção efetiva do GFIA, mantém-se o mínimo de duas pessoas com boa reputação e experiência suficiente. Contudo, propõe-se que tenham de ser residentes na União, trabalhadores full-time ou, não tendo um vínculo de emprego com o GFIA, se comprometam a conduzir a atividade desse GFIA a tempo inteiro (artigo 8.º, n.º 1, alínea c)).

A Comissão avança com a proposta de densificação das informações instrutórias do processo de autorização dos GFIA junto do respetivo Estado-Membro de origem (artigo 7.º, n.º 2), incluindo-se:

a) Relativamente às pessoas que dirigem efetivamente as atividades do GFIA, uma descrição detalhada da sua função, cargo e nível de senioridade, das linhas de reporte e responsabilidades no GFIA e fora do GFIA, do tempo alocado a cada responsabilidade e dos recursos humanos e técnicos que suportam as suas atividades;

b) No âmbito do programa de atividades com a estrutura organizativa (o nosso “manual de governação”), uma descrição detalhada dos recursos humanos e técnicos que serão usados pelo GFIA na sua atividade e na supervisão da atividade das entidades subcontratadas.

Importa notar que estas alterações têm pouco impacto no ordenamento jurídico português, uma vez que o Regulamento da CMVM n.º 2/2015 já exigia aquelas informações no seu Anexo A (elementos e informação instrutória relativa ao pedido de autorização de SGOIC).

3. Subcontratação

Com vista à proteção dos investidores no âmbito de atividade transfronteiriça, a Comissão propõe que as autoridades competentes dos Estados-Membros comuniquem à ESMA, anualmente, as situações em que GFIA deleguem mais funções de gestão do investimento e gestão de risco em entidades de terceiros Estados do que aquelas que retenham (“notificações de subcontratações”) (artigo 7.º, n.ºs 5 e 8). Ainda no tocante à delegação de funções, propõe-se clarificar que as disposições de delegação se aplicam não só a todas as funções enumeradas no Anexo I da Diretiva AIFMD, como também aos serviços acessórios.

4. Depositário

São ainda de destacar as propostas relativas aos serviços de custódia. A grande desilusão prende-se com a ausência de proposta relativa a um passaporte europeu para os depositários. Em todo o caso, a Comissão propõe, por um lado, que as autoridades competentes dos Estados-Membros possam autorizar que o depositário esteja sedeado noutro país que não o Estado-Membro de origem do FIA, de forma a que, com maior concorrência, se promova uma maior eficiência de custos e estruturas (artigo 61.º, n.º 5). Por outro lado, propõe integrar as centrais de valores mobiliários na cadeia de custódia, sem se sobrecarregar os depositários com exigências de due diligence no processo de subcontratação destas entidades, em atenção ao facto de serem supervisionadas (artigo 21.º, n.º 11, alínea c)). De facto, atualmente, não sendo as centrais de valores mobiliários consideradas entidades subcontratadas pelos depositários, estes deparam-se com dificuldades no acesso à informação necessária para o cumprimento cabal dos seus deveres.

5. Atividade de concessão de empréstimos

A Proposta vem ainda introduzir regras específicas para os gestores de FIA que concedem empréstimos – o equivalente aos nossos organismos de investimento alternativo especializado de créditos (OIAE de créditos) – com vista a reduzir o risco sistémico para o sistema financeiro que resulta da atividade destes GFIA, proteger o valor do investimento e reduzir a pressão de liquidez. Em primeiro lugar, destaca-se a proposta de uniformização dos instrumentos de liquidez ao nível da União Europeia, através dum Anexo V à AIFMD, onde são listados os diferentes instrumentos de liquidez que podem ser usados pelos GFIA (a restrição temporária de resgates, a existência de período mínimo entre o pedido de resgate e a sua liquidação financeira, a cobrança de comissão de resgate, períodos de suspensão de subscrições e resgates, o swing pricing, anti-dilution levy, resgates em espécie e side pockets), devendo o ativar e desativar desses instrumentos ser comunicados às autoridades competentes. Em matéria de gestão de riscos, a Comissão propõe que os gestores de FIA concedentes de crédito elaborem e implementem políticas, procedimentos e processos atualizados e eficazes para a concessão de créditos, a avaliação do risco de crédito e a administração e monitorização da carteira de créditos, a rever com periodicidade mínima anual (artigo 15.º, n.º 3, alínea d)). Propõe-se ainda que o empréstimo concedido a um único mutuário pelo FIA não possa exceder 20% do capital total do FIA, quando o mutuário seja uma instituição financeira ou um FIA (artigo 15, n.º 4a). A Proposta inclui também normas que visam evitar potenciais conflitos de interesses, proibindo a concessão de empréstimos de um FIA ao seu GFIA, ao pessoal do seu GFIA, ao seu depositário ou a quem este delegue as suas funções (artigo 15, n.º 4d). Neste âmbito, a Comissão propõe que o GFIA assegure que o FIA retém, numa base contínua, 5% do valor nocional dos empréstimos que concedeu (originated) (não comprado em mercado secundário) e vendeu subsequentemente no mercado secundário (artigo 15, n.º 4e). A propósito da gestão de liquidez, tendo os GFIA, em geral, de assegurar a coerência da estratégia de investimento, do perfil de liquidez e da política de reembolsos em relação a cada um dos FIA por si geridos, propõe-se que apenas os FIA fechados (closed-ended) se possam dedicar à concessão (origination) de empréstimos de forma significativa (ou seja, com um valor nocional total superior a 60% do valor patrimonial líquido (Net Asset Value)); que os GFIA adotem pelo menos um instrumento de gestão de liquidez (que poderão ser os redemption gates, notice periods e redemption fees); e que os GFIA que giram FIA abertos (open-ended) possam, justificadamente, em circunstâncias excecionais, no interesse dos investidores e nos termos previstos nos respetivos documentos constitutivos, ativar instrumentos de gestão de liquidez previstos no referido Anexo V da AIFMD.

6. Deveres de divulgação

Da proposta resulta, também, o alargamento das obrigações de divulgação que os GFIA devem assegurar, para fins de transparência, nomeadamente as condições de utilização dos instrumentos de gestão de liquidez, as taxas e encargos que serão suportados pelo GFIA ou pelas suas afiliadas, pelos FIA ou a qualquer um dos seus investimentos, a composição da carteira de empréstimos concedidos (originated), a identificação de sociedade-mãe, subsidiária ou special purpose vehicle (SPV) relativo aos investimentos no FIA pela GFIA, pelos seus colaboradores ou administradores ou afiliadas (artigo 23.º), bem como os instrumentos e mercados em que negoceia em nome dos FIA sob sua gestão (artigo 24.º).

Por fim, a Proposta atualiza os requisitos para que as entidades de países terceiros não estejam constituídas em jurisdições identificadas como países de alto risco, de acordo com a mais recente legislação europeia em matéria de branqueamento de capitais (artigos 21.º, n.º 6, c), 35, n.º 2, b), 36, n.º 1, c), 37, n.º 7, e), 40, n.º 2, b) e 42, n.º 1, c)).

A proposta foi já levada ao Conselho da União Europeia para discussão, a que se seguirá eventual apreciação e aprovação pelo Parlamento Europeu. 

Maria Gabriela Teixeira Duarte | gtd@servulo.com

José Eduardo Oliveira | jpo@servulo.com

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