Issues Paper sobre Ecossistemas Digitais, Big Data e Algoritmos
PUBLICAÇÕES SÉRVULO 09 Jul 2019
A digitalização da economia levou ao aparecimento de novos modelos de negócios baseados em plataformas multilaterais. Em 2018, 94% dos utilizadores de internet portugueses fizeram, pelo menos, uma compra online dentro de uma diversa gama de categorias (Nielsen, 2018). Devido à importância crescente desta questão, a Autoridade da Concorrência (AdC) publicou um Issues Paper sobre a aplicação do Direito da Concorrência às especificidades dos “Ecossistemas Digitais, Big Data e Algoritmos”. Sumariamente, a AdC analisa o papel do big data como um fator que potencia os efeitos de rede e que é crucial para os ecossistemas digitais de produtos e serviços.
Um dos desafios para a política da concorrência é o de que as plataformas incumbentes podem adotar estratégias de exclusão, por exemplo, através da restrição do acesso de concorrentes aos dados necessários para o desenvolvimento das suas atividades.
Ao nível setorial, a Segunda Diretiva de Serviços de Pagamento (PSD2) regula o acesso aos dados na era digital. A PSD2, transposta para Portugal em novembro de 2018, impõe aos bancos obrigações de providenciar aos operadores de FinTech o acesso a dados de clientes com o objetivo de, a seu pedido, lhes oferecer certos serviços de pagamento. Já tivemos oportunidade de analisar, num update anterior, o Issues Paper da AdC sobre FinTech e, em particular, os riscos de encerramento do acesso dos operadores de FinTech a dados de clientes pelos bancos, bem como as recomendações da AdC para mitigar esses riscos.
O big data tem vindo a contribuir para o desenvolvimento de algoritmos de preços, de monitorização e de recomendação. Existem efeitos positivos, como uma maior facilidade na descoberta de produtos e comparação de preços ou a diminuição de custos de transação e de pesquisa. Contudo, o big data também pode facilitar a colusão no mercado, particularmente ao nível dos preços.
Como antecipámos “juntamente com a sua atividade normal nos setores tradicionais, a AdC está bastante atenta a novas práticas de exclusão na economia digital. Empresas que cometem estes atos não devem ser desresponsabilizadas devido ao uso de algoritmos ou de inteligência artificial suscetível de conduzir a uma conduta anticoncorrencial. Isto significa que a AdC não tem receio de agir no ambiente digital onde o uso de tecnologia facilita o comportamento anticoncorrencial” (para maiores desenvolvimentos, ver o nosso capítulo em “The Cartels and Leniency Review – 2019”).
As empresas devem estar conscientes das oportunidades e perigos desta nova era, tendo em conta a severidade das sanções por violação do Direito da Concorrência tanto ao nível do enforcement público como privado. A compliance recompensará aqueles que por ela se pautarem!
Alberto Saavedra