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Amgen vs Sanofi: No TUP Todos Os Minutos Contam

PUBLICAÇÕES SÉRVULO 07 Dez 2023

A 1 de Junho de 2023, no dia da entrada em funções do Tribunal Unificado de Patentes (“TUP”), e antes de o Case Management System – sistema eletrónico de gestão de processos do TUP (“CMS”) - se encontrar operacional, teve lugar um incidente curioso que pôs à prova as regras de processo do TUP, evidenciando que todos os minutos contam na propositura de ações de violação de patente e de ações de invalidade da mesma.

As duas multinacionais farmacêuticas, Sanofi e Amgen partilham já um longo histórico de disputas judiciais referentes à Patente Europeia, da titularidade da Amgen, EP 3 666 797 (“EP 797”) que protege a substância ativa evolocumab. Sendo que a Amgen decidiu não fazer o opt-out aquando da integração do TUP, esta patente tornou-se numa Patente Europeia com Efeito Unitário. No primeiro dia de funções do TUP a Amgen decidiu, intentar uma ação de violação da patente em questão contra a Sanofi e, de igual modo, teve a Sanofi a ideia inversa: intentar, veja-se, no mesmo dia, quase à mesma hora, uma ação de invalidade da  EP 797.

Sendo que o CMS não se encontrava ainda em funcionamento efetivo, e a Regra 4 nº 2 das Regras de Procedimento do TUP[1] indica que uma parte pode apresentar um documento em papel na Secretaria ou numa subsecretaria, se o sistema de eletrónico deixar de funcionar, a Sanofi entregou uma cópia em papel da ação de invalidade na Secretaria do Luxemburgo cuja receção foi registada às 11:26 (CET), ação esta intentada na Divisão Central de Munique. Paralelamente, a Amgen, ré na ação de invalidade, entregou uma cópia em papel da ação de violação da patente na subsecretaria da Divisão Local de Munique, cuja receção foi registada às 11:54 (CET).

O Unified Patent Court Agreement (“UPCA”) estipula, no seu Artigo 33 nº 4 que uma ação de invalidade deve ser proposta na Divisão Central, a menos que uma ação anterior de violação que concerne a mesma patente, entre as mesmas partes, tenha já sido intentada perante uma divisão local ou regional. Neste caso, deve a ação posterior de invalidade ser intentada junto da mesma divisão na qual foi intentada a ação de violação.

Mais tarde, quando a documentação das ações foi depositada no CMS, a data desse depósito registou-se anterior para a ação da Amgen e posterior para a ação da Sanofi. Por esta razão, a Amgen invocou a inadmissibilidade da ação de invalidade da Sanofi, alegando que, pela sua posterioridade à ação de violação da patente, e de acordo com o Artigo 33 n.º 4 do UPCA, deveria esta ser intentada perante a mesma divisão da ação anterior, a Divisão Local de Munique. A Amgen invocou ainda, que a Sanofi não depositou a cópia da sua ação no local certo, ao que devia tê-lo feito na Secretaria da Divisão Central de Munique, onde o caso iria ser julgado, de acordo com as regras de competência do UPCA.

O juiz, recorrendo aos princípios de certeza, previsibilidade e celeridade que devem pautar o direito europeu e, consequentemente, as regras do Tribunal Unificado de Patentes, decidiu que o fator determinante para aferir a prioridade das ações é o momento exato em que ambas foram intentadas, ab initio. Ou seja, não tem relevância a data em que se registaram os documentos no CMS, nem outros fatores subjetivos, mas sim a hora exata em que ambas as partes intentaram as suas ações, que difere por só (e apenas) 28 minutos.  Ademais, atenta a regra Regra 4 nº 2 das Regras de Procedimento do TUP, o juiz considerou que podiam os documentos referentes à propositura daquela ação ser entregues em qualquer Secretaria.

Assim sendo, uma vez que a Sanofi depositou a cópia física da sua ação mais cedo, ainda que por uma pequeníssima diferença de tempo, o juiz rejeitou a invocação de inadmissibilidade da Amgen e deu seguimento à ação da Sanofi na Divisão Central de Munique. Portanto, terá a ação de invalidade lugar na Divisão Central de Munique e a ação de violação da mesma patente na Divisão Local de Munique, seguindo o TUP uma abordagem bifurcada da competência para julgar estas ações. Há a hipótese de a Divisão Local de Munique remeter a ação de violação da patente para a total competência da Divisão Central, ficando esta a julgar ambas as ações, de acordo com o Artigo 33 n. º 3 alínea c) do UPCA, mas com o acordo de ambas as partes, o que não nos parece um cenário provável.

Esta decisão na longa querela Amgen/Sanofi permite retirar a conclusão de que o TUP está comprometido com uma interpretação clara e pragmática das suas regras de procedimento e competência. Assim, em situações em que tal possa ser previsto, deverá ser dada a maior celeridade à propositura de ações, para evitar uma bifurcação de competências, e, consequentemente, de decisões, uma vez que, no TUP, todos os minutos contam.

Mariana Costa Pinto | mcp@servulo.com

Leonor Ruano Silveira | lrs@servulo.com



[1] Regra 4 nº2 das Regras de Procedimento do TUP: “Where it is not possible to lodge a document electronically for the reason that the electronic case management system of the Court has ceased to function a party may lodge a document in hard-copy form at the Registry or a sub-registry. An electronic copy of the document shall be lodged as soon as practicable thereafter”.

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