Ajuda externa: Fim das 'golden share' divide advogados entre "preconceito europeu" e "mecanismo desadequado"
SÉRVULO NA IMPRENSA 12 Jun 2011 in Lusa
O fim das 'golden share' imposto pela 'troika' até julho não é consensual. Se para uns há um preconceito europeu contra o Estado acionista, para outros os poderes especiais em empresas estratégicas não são o único mecanismo nem o mais adequado para acautelar os interesses nacionais. Estas são as opiniões de alguns dos mais relevantes advogados especialistas em direito comunitário e da concorrência ouvidos pela agência Lusa. O Estado detém direitos especiais em três empresas consideradas estratégicas para o país - EDP, Galp e PT -, mas todos têm sido contestados por Bruxelas e já foram alvo de processos no Tribunal de Justiça da União Europeia.
Miguel Gorjão-Henriques, sócio da Sérvulo & Associados, escritório que assessorou diretamente o Estado Português no processo concluído em 2010 contra os direitos especiais na PT, salienta que não sabe se as 'golden-share' "têm de acabar ou vão acabar", mas considera que as decisões tomadas a nível da União Europeia "são mal fundadas" e "baseadas num preconceito contra o Estado acionista".
Outra opinião tem José Luís da Cruz Vilaça, sócio da PLMJ que exerceu funções de advogado-geral no Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias e de presidente do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias. "As 'golden share' não são em princípio admitidas pelo direito da UE e nem o único instrumento nem o mais adequado para acautelar os interesses nacionais. O Estado não deve politizar a gestão das empresas", salientou. Cruz Vilaça considera que o Estado "deve exercer a função de regulador na medida em que esta se justifique" e tendo em conta as regras da UE, "não precisando para tal de ser necessariamente proprietário" de empresas.
Daniel Proença de Carvalho, presidente dos conselhos de administração da Uria Menéndez e da ZON e antigo vice-presidente da assembleia geral da PT, lembra que há muitos países europeus com participações do Estado em empresas estratégicas."Esta situação não é apenas de Portugal. Empresas alemãs, espanholas, italianas, francesas, todos os países da Europa têm mantido soluções de índole protecionista para preservar os interesses nacionais e os seus centros de decisão, embora de dimensão variável, umas com mais imaginação outras com menos", sublinhou.
Para Miguel Gorjão-Henriques, "é de extrema importância" que "possa haver empresas globais a operar a partir de Portugal" e ser "'pivots' numa estratégia de afirmação da economia portuguesa no contexto europeu e mundial". "É fundamental que Portugal mantenha capacidade de atração de investimento e inovação estrangeira, mas também que os bens essenciais, como a energia, telecomunicações e água, se mantenham sob controlo dos próprios portugueses, para que possamos ser autónomos na afirmação do nosso futuro comum", sublinha.
Proença de Carvalho alerta para o facto de as empresas poderem vir a ser inseridas em estratégias globais que descurem os interesses dos portugueses, mas Cruz Vilaça sublinha que "a partir do momento em que o país entrou na UE, a questão dos centros de decisão deixam de ser em larga medida uma questão nacional para ser uma questão europeia".
JMG
Lusa