Novas regras europeias sobre divulgação de informações em matéria de sustentabilidade das empresas: as normas de nível 1
SÉRVULO PUBLICATIONS 13 Dec 2022
Num contexto de transição da União Europeia («UE») para uma economia sustentável, no passado dia 28 de novembro foi adotada a Diretiva Comunicação de Informações sobre a Sustentabilidade das Empresas[1] («Corporate Sustainability Reporting Directive» ou «CSRD»), que procede à modificação de vários diplomas europeus, com particular destaque para a Diretiva Contabilística[2], visando reforçar as regras existentes em matéria de divulgação de informações não financeiras, que haviam sido aditadas pela Diretiva Informação Não Financeira[3] à Diretiva Contabilística.
A CSRD procede à modificação da terminologia utilizada na Diretiva Contabilística, promovendo a substituição da expressão «não financeiras» por «informações sobre sustentabilidade»[4].
O referido diploma procede ao alargamento do âmbito de aplicação de requisitos estabelecidos na Diretiva Contabilística relativos a comunicação de informações sobre sustentabilidade a categorias adicionais de empresas.
Com efeito, além das empresas já sujeitas à Diretiva Informação Não Financeira (nomeadamente, as grandes empresas que sejam entidades de interesse público, i.e., que tenham ações admitidas à negociação num mercado regulamentado na UE, sejam instituições de crédito ou empresas de seguros, com mais de 500 trabalhadores), passam também a estar obrigadas a divulgar um relato sobre sustentabilidade todas as grandes empresas e todas as empresas, com exclusão das microempresas, cujos valores mobiliários estejam admitidos à negociação num mercado regulamentado na UE (passando a estar obrigadas, portanto, também as pequenas e médias empresas («PME») cotadas) e, no que concerne ao relato de sustentabilidade a nível do grupo, passam a estar obrigadas todas as empresas que sejam empresas-mãe de grandes grupos[5] (além das empresas-mãe de grandes grupos que sejam entidades de interesse público, com mais de 500 trabalhadores, já sujeitas à Diretiva Informação Não Financeira).
No que concerne ao seu conteúdo, o relato de sustentabilidade (ou o relato de sustentabilidade a nível consolidado), deverá conter informações necessárias à compreensão do impacto da empresa (ou do grupo) nas questões de sustentabilidade (i.e., questões ambientais, sociais, de governação, relativas a trabalhadores, ao respeito dos direitos humanos, ao combate à corrupção e ao suborno) e à forma como as questões de sustentabilidade afetam a evolução, o desempenho e a posição da empresa (ou do grupo). Tais informações devem incluir, entre outros elementos, uma descrição dos planos da empresa (ou do grupo) para assegurar que o seu modelo empresarial e a sua estratégia são compatíveis com a transição para uma economia sustentável; da forma como o modelo empresarial e a estratégia da empresa (ou do grupo) têm em conta os interesses das partes interessadas e o impacto da empresa (ou do grupo) nas questões de sustentabilidade; do processo relativo ao dever de diligência aplicado pela empresa (ou pelo grupo) no que respeita às questões de sustentabilidade; dos principais efeitos adversos, reais ou potenciais, relacionados com as próprias operações da empresa (ou do grupo) e com a sua cadeia de valor; e dos principais riscos para a empresa (ou para o grupo) relacionados com questões de sustentabilidade[6].
De notar que as empresas filiais ou sucursais que excedam determinados limiares, de empresas de países terceiros com uma atividade significativa no território da UE (i.e. que tiverem gerado um volume de negócios líquido superior a 150 milhões de euros na UE em cada um dos dois últimos exercícios consecutivos), passam a estar obrigadas a publicar um relatório de sustentabilidade, o qual deverá ser acompanhado de um parecer de revisão limitada[7].
A CSRD entrará em vigor 20 dias após a sua publicação no Jornal Oficial da UE, sendo que os Estados-Membros terão, a partir desse momento, 18 meses para transpor para os respetivos ordenamentos jurídicos internos as novas regras europeias.
Cumpre ainda salientar que a CSRD será aplicável em 4 fases atendendo às empresas a que se destina[8]:
- As grandes empresas e empresas-mãe de um grande grupo que estão atualmente sujeitas à Diretiva Contabilística deverão proceder à comunicação de informações ao abrigo da CSRD em 2025, sobre o exercício financeiro com início em 1 de janeiro de 2024.
- As grandes empresas e as empresas-mãe de um grande grupo que não estão atualmente sujeitas à Diretiva Contabilística deverão proceder à comunicação de informações ao abrigo da CSRD em 2026, sobre o exercício financeiro com início em 1 de janeiro de 2025.
- As PME cujos valores mobiliários estejam admitidos à negociação num mercado regulamentado na UE e as instituições de crédito de pequena dimensão e não complexas e empresas de seguros e resseguros cativas, desde que sejam grandes empresas ou sejam PME com valores mobiliários admitidos à negociação num mercado regulamentado na UE, deverão proceder à comunicação de informações ao abrigo da CSRD em 2027, sobre o exercício financeiro com início em 1 de janeiro de 2026.
- As empresas filiais ou sucursais de empresas de países terceiros com atividade significativa na UE e as PME com valores mobiliários admitidos à negociação num mercado regulamentado na UE quando se tenham autoexcluído dos requisitos de relato de sustentabilidade durante um período transitório de 2 anos[9], deverão proceder à comunicação de informações ao abrigo da CSRD em 2029, sobre o exercício financeiro com início em 1 de janeiro de 2028.
Note-se que a Comissão Europeia deverá adotar vários atos delegados que complementem a CSRD (normas de nível 2), devendo, para o efeito, tomar em consideração parecer técnico do Grupo Consultivo para a Informação Financeira na Europa («EFRAG»).
Fica a expectativa de que a novas regras introduzidas pela CSRD permitam aos investidores a tomada de decisões informadas sobre questões de sustentabilidade e contribuam para o redireccionamento dos fluxos de capitais privados para investimentos mais sustentáveis do ponto de vista ambiental, social e da governação das empresas.
Paulo Câmara | pc@servulo.com
Andreea Babicean | aba@servulo.com
[1] Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento (UE) n.º 537/2014, a Diretiva 2004/109/CE, a Diretiva 2006/43/CE e a Diretiva 2013/34/UE, no que diz respeito ao relato de sustentabilidade das empresas, disponível em: https://data.consilium.europa.eu/doc/document/PE-35-2022-INIT/pt/pdf.
[2] Diretiva 2013/34/UE do Parlamento Europeu e do Conselho de 26 de junho de 2013 relativa às demonstrações financeiras anuais, às demonstrações financeiras consolidadas e aos relatórios conexos de certas formas de empresas, na sua versão atual («Diretiva Contabilística»).
[3] Diretiva 2014/95/UE do Parlamento Europeu e do Conselho de 22 de outubro de 2014, no que se refere à divulgação de informações não financeiras e de informações sobre a diversidade por parte de certas grandes empresas e grupos («Diretiva Informação Não Financeira»).
[4] Cf., a este propósito, o Considerando 8 da CSRD.
[5] Cf., a este respeito, o artigo 1.º, n.ºs 4 e 7 da CSRD, que altera os artigos 19.º-A e 29.º-A da Diretiva Contabilística, e os considerandos 17, 18, 19 e 21 da CSRD.
[6] Cf. o artigo 1.º, n.ºs 2, 4 e 7 da CSRD, que altera os artigos 2.º, 19.º-A e 29.º-A da Diretiva Contabilística.
[7] Cf., a este respeito, o artigo 1.º, n.º 14 da CSRD, que insere um novo capítulo na Diretiva Contabilística, o «Capítulo 9-A Comunicação de Informações relativas a empresas de países terceiros», que compreende os artigos 40.º-A a 40.º-D, e o considerando 20 da CSRD.
[8] Cf. artigo 5.º da CSRD.
[9] Cf., a este propósito o considerando 21 e o artigo 1.º, n.º 4 da CSRD, que altera o artigo 19.º-A da Diretiva Contabilística.