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Novas regras do Banco de Portugal sobre exclusão de serviços baseados em instrumentos de pagamento específicos utilizados de forma limitada: o Aviso n.º 3/2023

SÉRVULO PUBLICATIONS 27 Mar 2023

1. Contexto e Âmbito de aplicação

No passado dia 15 de março de 2023, entrou em vigor o Aviso do Banco de Portugal n.º 3/2023 (doravante o “Aviso”), que regula as modalidades de aplicação das exclusões relativas a redes restritas previstas no Regime Jurídico dos Serviços de Pagamento e da Moeda Eletrónica (“RJSPME”)[1] e o respetivo procedimento de comunicação.

Na origem da problemática relativa às redes restritas está a Diretiva (UE) 2015/2366 do Parlamento Europeu e do Conselho de 25 de Novembro de 2015 (doravante, a “DSP2”) relativa aos serviços de pagamento no mercado interno, que determina[2] a exclusão do seu âmbito de aplicação aos serviços baseados em instrumentos de pagamento específicos que só possam ser utilizados de forma limitada e que sejam: (1) «instrumentos que só permitem a aquisição de bens ou serviços pelo seu titular nas instalações do emitente ou numa rede restrita de prestadores de serviços diretamente ligados por um acordo comercial a um emitente profissional», e (2) «instrumentos que só podem ser utilizados para adquirir uma gama muito restrita de bens ou serviços».[3]

Tais exclusões, vieram a ser, na sua totalidade, transpostas para o RJSPME, tendo este previsto, ainda, um dever de comunicação por parte dos prestadores dos referidos serviços, em determinadas situações.

Mais recentemente, em 24 de fevereiro de 2022, Autoridade Bancária Europeia (EBA) emitiu as «Orientações sobre a exclusão relativa a redes restritas ao abrigo da DSP2 (EBA/GL/2022/02)», de modo a especificar as modalidades de aplicação da exclusão. O Banco de Portugal, na qualidade de autoridade nacional competente para a supervisão no âmbito do RJSPME, vem agora implementar estas Orientações através do Aviso que aqui se analisa.

2. Procedimento, forma e conteúdo da comunicação

Os emitentes dos instrumentos de pagamento específicos têm a obrigação de enviar uma comunicação ao Banco de Portugal, no prazo de 30 dias, quando o valor total das operações de pagamento executadas nos últimos 12 meses atingir o montante de 1 milhão de euros[4]. O cálculo deste limiar deve ser efetuado ao nível de cada emitente, contabilizando todas as operações de pagamento executadas no Estado-Membro em causa e todos os instrumentos de pagamento específicos oferecidos pelo mesmo emitente[5].

A referida comunicação deverá ser acompanhada, por um lado, de diversos elementos, entre os quais, indicação do tipo de exclusão ao abrigo da qual a atividade é exercida, do volume e do valor das operações de pagamento que se realizarão anualmente com os instrumentos de pagamento, descrição dos riscos a que o cliente está exposto ao utilizar o instrumento de pagamento específico e da atividade desenvolvida[6]. A este propósito, estabelece-se ainda uma cláusula geral que atribui relevo a outras informações que permitam às autoridades competentes avaliar a atividade desenvolvida[7]. O Aviso n.º 3/2023 exige que os emitentes que sejam entidades que prestam serviços de pagamento ou que emitem moeda eletrónica ao abrigo da disciplina do RJSPME forneçam elementos complementares[8].

Por outro lado, os emitentes terão de instruir a comunicação com elementos específicos em função da exclusão que pretendam usufruir, conforme se trate, respetivamente, da exclusão prevista na subalínea i), ou na subalínea ii), ambas da alínea k) do artigo 5.º do RJSPME. Na primeira hipótese, o emitente do instrumento de pagamento terá de comprovar, por exemplo, a celebração de acordo contratual direto para a aceitação de operações de pagamento entre o próprio e cada fornecedor de bens e serviços e, se for caso disso, cada aceitante que opere na rede restrita. Na segunda hipótese, o emitente terá de comprovar a existência de relação funcional entre os bens ou os serviços que podem ser adquiridos com o instrumento de pagamento, incluindo a indicação da categoria específica de bens ou serviços com um fim comum[9]. Por seu turno, consagra-se o direito do Banco de Portugal de solicitar informações ou esclarecimentos adicionais ao emitente, nomeadamente, quando sejam prestadas informações incompletas, vagas ou ambíguas, dispondo este de um prazo de 20 dias para fornecer os elementos solicitados[10].

Note-se que o Aviso n.º 3/2023 prevê ainda uma obrigação de comunicação subsequente de informação ao Banco de Portugal. Com efeito, sempre que tenha ocorrido ou que o emitente perspetive uma alteração substancial de qualquer informação relacionada com o(s) mesmo(s) instrumento(s) de pagamento específico(s) fornecida na comunicação inicial, deverá enviar uma comunicação adicional ao Banco de Portugal[11].

Por fim, note-se que os instrumentos de pagamento específicos abrangidos pelo âmbito de aplicação das exclusões previstas no artigo 5.º, n.º 1, alínea k) do RJSPME serão objeto de divulgação pública, sendo incluídos no registo do Banco de Portugal e no registo central da Autoridade Bancária Europeia (EBA)[12].

3. Notas finais

No que toca à aplicação retroativa do presente Aviso, estabelece o seu artigo 9.º uma obrigação adicional.

Os emitentes que beneficiem da exclusão prevista no artigo 5.º, alínea k), subalíneas i) ou ii), do RJSPME e que já tenham enviado uma comunicação ao Banco de Portugal nos termos do artigo 6.º, n.º 1, do mesmo diploma, devem enviar, até 90 dias após o dia 15 de março de 2023, uma nova comunicação ao Banco de Portugal tendo em conta as disposições do Aviso.

Com este Aviso é intenção do Banco de Portugal conferir uma maior simplicidade, certeza e previsibilidade ao tratamento das notificações recebidas pelo mesmo, assim como ao modelo de comunicação respetivo. Ficará por verificar se, de facto, assim será.

 

Catarina Mira Lança | cml@servulo.com

Andreea Babicean | aba@servulo.com



[1] Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 91/2018, de 12 de novembro.

[2] Cfr. Artigo 3.º, alínea k) da DSP2.

[3] A título elucidativo, e para melhor compreensão desta problemática, a DSP2 esclarece que os instrumentos de pagamento abrangidos pela exclusão da rede restrita poderão incluir os: «cartões de fidelidade de certas lojas, os cartões para abastecimento de combustível, os cartões de membro, os passes de transportes públicos, os talões de estacionamento, os títulos de refeição ou os títulos de serviços específicos que estão, por vezes, sujeitos a um quadro jurídico específico em matéria fiscal e laboral, destinado a promover a utilização destes instrumentos de molde a cumprir os objetivos estabelecidos na legislação social.».

[4] No que concerne à contagem de prazos, note-se que o prazo de 12 meses inicia-se na data da emissão do instrumento de pagamento, e o prazo de 30 dias inicia-se no dia útil seguinte após ser atingido o valor de 1 milhão de euros (cf. artigo 4.º, n.ºs 1, 2, 4 e 5 do Aviso n.º 3/2023).

[5] Cfr. artigo 4.º, n.º 3 do Aviso n.º 3/2023.

[6] Cfr. artigo 5.º, n.º 1, alíneas a) a h) do Aviso n.º 3/2023. Ainda a propósito dos elementos instrutórios da comunicação inicial, os emitentes terão de comprovar junto do Banco de Portugal o disposto nas várias subalíneas da alínea h) do n.º 1 do artigo 5.º, e.g., comprovação de que são aplicadas restrições técnicas e contratuais que limitam a utilização do instrumento de pagamento e de que o meio de pagamento não acomoda simultaneamente instrumentos de pagamento abrangidos pela disciplina do RJSPME e instrumentos de pagamento específicos abrangidos pelo âmbito de aplicação das exclusões previstas no artigo 5.º, n.º 1, alínea k) do RJSPME.

[7] Cfr. artigo 5.º, n.º 1, alínea i) do Aviso n.º 3/2023.

[8] Cfr. artigo 5.º, n.º 2 do Aviso n.º 3/2023.

[9] Cfr. artigo 5.º, n.ºs 3 e 4 do Aviso n.º 3/2023.

[10] Cfr. Artigo 5.º, n.º 5 do Aviso n.º 3/2023.

[11] Cfr. artigo 6.º, n.º 1 do Aviso n.º 3/2023, que concretiza um conjunto de informações que o emitente deverá comunicar ao Banco de Portugal. Mais se estabelecendo, no n.º 2 do mesmo artigo, que em caso de intenção de modificaçãode algum dos elementos referidos no n.º 1 do mesmo artigo, o emitente comunica-a ao Banco de Portugal, por escrito, com a antecedência mínima de 30 dias face à data da sua verificação (cf. artigo 6.º, n.º 2 do Aviso n.º 3/2023).

[12] Cfr. artigo 7.º do Aviso n.º 3/2023.

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