Defesa da Transparência e da Integridade nas Competições Desportivas
SÉRVULO PUBLICATIONS 12 Sep 2017
No dia 28 de agosto de 2017 foi publicada em Diário da República a Lei n.º 101/2017, de 28 de agosto, que consagra novos deveres impostos quer às federações, quer às sociedades desportivas, relativamente à defesa da transparência e da integridade nas competições desportivas.
Esta Lei, que entrou em vigor no passado dia 2 de setembro, surge na sequência da adoção, pela Assembleia da República, de novas medidas relativas à responsabilidade penal por comportamentos suscetíveis de afetar a verdade, a lealdade e a correção nas competições desportivas (Lei n.º 13/2017, de 2 de maio), tendo sido considerado que as ferramentas jurídico-penais então implementadas não esgotavam o universo de medidas necessárias à defesa dos valores da ética, lealdade e verdade desportivas, e impondo-se, concomitantemente, um reforço dos deveres de transparência e de promoção da integridade e credibilização das competições desportivas.
Neste quadro circunstancial, a nova Lei veio introduzir alterações aos seguintes diplomas:
- Decreto-Lei n.º 10/2013, de 25 de janeiro (“Regime Jurídico das Sociedades Desportivas”);
- Decreto-Lei n.º 248.º-B/2008, de 31 de dezembro (“Regime Jurídico das Federações Desportivas e das Condições de Atribuição do Estatuto de Utilidade Pública Desportiva”);
- Decreto-Lei n.º 273.º/2009, de 1 de outubro (“Regime Jurídico dos Contratos-programa de Desenvolvimento Desportivo”);
- Decreto-Lei n.º 66/2015, de 29 de abril (“Regime Jurídico dos Jogos e Apostas Online”);
- Decreto-Lei n.º 67/2015, de 29 de abril (“Regime Jurídico da Exploração e Prática das Apostas Desportivas à Cota de Base Territorial”).
I. Das alterações ao Regime Jurídico das Sociedades Desportivas
A principal alteração registada relaciona-se com o alargamento da proibição de subscrição ou aquisição de participações de sociedades desportivas. Com o novo regime, passa a estar vedada, a uma entidade que já detenha uma posição maioritária no capital social de uma sociedade desportiva, ou que sobre ela exerça uma influência dominante nos termos do artigo 21.º do Código dos Valores Mobiliários, a detenção de mais de 10% do capital social de outra sociedade desportiva com atuação na mesma competição ou prova desportiva.
Adicionalmente, a Lei alarga as situações de incompatibilidade no exercício de funções de gestão de sociedades desportivas, prevendo-se agora expressamente que não podem ser administradores ou gerentes de sociedades desportivas quaisquer pessoas que possuam ligação a empresas ou organizações que promovam, negoceiem, organizem ou conduzam eventos ou transações relacionadas com apostas desportivas.
Por fim, a Lei consagra ainda novos deveres de transparência aplicáveis às sociedades desportivas, instituindo uma nova obrigação de comunicação, pela sociedade desportiva, no início de cada época desportiva ou após alguma alteração relevante, da relação completa dos titulares de participações diretas ou indiretas correspondentes a 10% do capital social ou dos direitos de votos, detidos isoladamente ou em conjunto.
Esta obrigação é aplicável às épocas desportivas presentemente em curso, com efeitos a partir do próximo dia 2 de outubro de 2017. Em caso de incumprimento, a sociedade desportiva fica sujeita à aplicação de sanções desportivas, nos termos regulamentares aprovados pela respetiva federação ou liga profissional.
Esta informação deverá ser pública, sendo prestada ao Instituto do Desporto, à federação competente e à liga profissional de clubes, no caso das competições profissionais.
II. Das alterações ao Regime Jurídico das Federações Desportivas e ao Regime Jurídico dos Contratos-programa de Desenvolvimento Desportivo
Em consequência das alterações acima enumeradas, é também consagrado um dever de publicação por parte das federações desportivas, nas respetivas páginas na Internet, das informações relativas à titularidade das participações sociais em sociedades desportivas e de outros dados relevantes de acesso público, previstos na legislação desportiva.
Por outro lado, passa igualmente a impor-se às federações desportivas um dever de aprovação e execução de programas de defesa da integridade desportiva. Tais programas devem permitir a formação e a sensibilização dos agentes desportivos sobre as suas responsabilidades, direitos e deveres no âmbito do combate à manipulação e corrupção desportivas, assim como sobre as consequências da adoção de comportamentos suscetíveis de afetar a verdade, a lealdade e a correção das competições desportivas e dos seus resultados.
Paralelamente, torna-se requisito para a concessão de apoios pelo Estado à federação a aprovação e a implementação dos referidos programas de defesa da integridade desportiva.
O incumprimento destas obrigações e de outras relacionadas com a defesa da integridade das competições constitui fundamento de suspensão dos apoios concedidos pelo Estado às federações desportivas, bem como do próprio estatuto de utilidade pública desportiva, a vigorar enquanto tal incumprimento de mantiver.
Por fim, passa também a ser obrigatória para as federações a publicação dos relatórios dos árbitros relativos às competições profissionais, assim como todos os atos de classificação técnica dos árbitros e respetivos fundamentos, elaborados pelo Conselho de Arbitragem.
III. Das alterações ao Regime Jurídico dos Jogos e Apostas Online e ao Regime Jurídico da Exploração e Prática das Apostas Desportivas à Cota de Base Territorial
A possibilidade de realização de apostas desportivas em eventos passa a estar subordinada ao cumprimento, por parte das sociedades desportivas neles participantes, das obrigações legalmente estabelecidas de transparência relativamente à respetiva titularidade.
Paralelamente, uma parte da receita obtida pelas apostas deverá ser repartida pelos clubes ou pelos praticantes, consoante o caso, e pelas federações organizadoras dos eventos com a finalidade de promoção da modalidade e execução de programas de defesa da integridade desportiva.