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Concessões de distribuição de energia elétrica em baixa tensão: princípios e calendarização

SÉRVULO PUBLICATIONS 28 Feb 2024

1. No dia 23 de fevereiro, foi publicada a Resolução do Conselho de Ministros n.º 27/2024, que estabelece os princípios e a calendarização para a atribuição de concessões municipais de distribuição de energia elétrica em baixa tensão (“BT”).

Considerando que estas concessões municipais são um “ativo estratégico para o País”, nomeadamente para o “cumprimento dos objetivos do Plano Nacional de Energia e Clima 2030”, o Conselho de Ministros reputa a Resolução n.º 27/2024 de “urgente, inadiável e indispensável à promoção do interesse público nacional”.

2. Os princípios estabelecidos na Resolução n.º 27/2024 resultam, em boa medida, de uma remissão para a Lei n.º 31/2017, que determina as regras aplicáveis à compatibilidade eletromagnética dos equipamentos, transpondo a Diretiva n.º 2014/30/UE. Estes princípios são os seguintes:

i) Salvaguarda da neutralidade financeira para os consumidores de eletricidade e para o Orçamento do Estado;

ii) Promoção da eficiência económica e das condições de desempenho eficaz do sistema objeto da concessão, salvaguardando a qualidade e abrangência do serviço público atualmente prestado como mínimo a assegurar;

iii) Promoção da coesão territorial quanto à sustentabilidade das concessões e ao nível de qualidade do serviço prestado;

iv) Salvaguarda da uniformidade tarifária no país;

v) Nivelamento das condições estruturais de desenvolvimento da atividade de distribuição de energia elétrica, nomeadamente em termos de custos e de incremento dos padrões de qualidade do fornecimento do serviço público;

vi) Promoção da gestão de energia e da eficiência energética pelos municípios, sem que esse esforço envolva prejuízo na justa remuneração devida aos municípios como concedentes;

vii) Garantia de inexistência de custos acrescidos a repercutir nos consumidores;

viii) Defesa da estabilidade do emprego, com a salvaguarda dos postos de trabalho e dos direitos dos trabalhadores afetos às concessões, nomeadamente em situações de transmissão ou cessação da concessão, bem como a exigência do cumprimento da legislação laboral.

3. No plano principio lógico, a grande novidade da Resolução passa, porém, pela referência ao princípio da autonomia local. Segundo o Conselho de Ministros, a operatividade deste princípio traduz-se na possibilidade de os municípios delimitarem geograficamente as concessões e decidirem adotar procedimentos individualizados ou sincronizados de contratação pública.

Contudo, esta alusão ao princípio da autonomia local exige conjugação com a Lei n.º 31/2017, que dá clara primazia ao “princípio da coerência territorial”, preferindo (i) a atribuição de concessões compreendidas na delimitação territorial das entidades intermunicipais, e (ii) a tramitação de procedimentos conjuntos.

A compressão do princípio da autonomia local é, assim, duplamente manifesta: por um lado, os municípios só poderão definir uma área territorial diferente se alegarem “razões ponderosas” e demonstrarem “vantagens relevantes desse cenário alternativo para o interesse público, com base em estudos técnicos e económicos com o mesmo nível de detalhe dos produzidos pelo regulador, se necessário acompanhados da estipulação, nas peças procedimentais, de condições contratuais adequadas para os contratos a celebrar”; por outro lado, a “eventual intenção, por parte de qualquer município, de não se integrar no processo de lançamento sincronizado dos procedimentos concursais”, depende da alegação daquelas razões ponderosas e da elaboração daqueles estudos, bem como da demonstração de que a opção da autarquia “não resulta em perdas globais de eficiência, equidade e coesão territorial, face ao cenário proposto pelo regulador”.

4. A Resolução n.º 27/2024 fixa ainda um calendário ambicioso para o lançamento dos procedimentos. 

Prazo

Tramitação

31 de julho de 2024

 

Os municípios e entidades intermunicipais competentes recebem a documentação relativa aos ativos e imobilizado afetos às redes de distribuição de eletricidade em BT (cfr. peças-tipo aprovadas pela Portaria n.º 397/2023)

 

31 de outubro de 2024

 

Os municípios e entidades intermunicipais competentes (i) constituem o agrupamento de entidades adjudicantes ou (ii) anexam aos cadernos de encargos dos procedimentos de contratação pública os estudos justificativos da não constituição do agrupamento

 

31 de março de 2025

 

As entidades (que integram o agrupamento de entidades adjudicantes) asseguram todas as deliberações necessárias ao lançamento do procedimento e atualizam a informação relativa aos ativos e imobilizado afetos às redes

 

30 de junho de 2025

 

O procedimento de concurso público para a atribuição das concessões é lançado no território continental português

 

 

5. Em face da visível compressão do princípio da autonomia local e da exigência destes prazos, o cumprimento da Resolução não será isento de dificuldades jurídicas, administrativas e financeiras.

A atuação da ERSE será decisiva para atingir as metas impostas, mais até porque Conselho de Ministros não consagrou um quadro normativo especificamente aplicável às autarquias inadimplentes.

Mark Kirkby | mak@servulo.com

Daniel Castro Neves | dcn@servulo.com

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