Branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo: medidas específicas de identificação e diligência, simplificadas e reforçadas
SÉRVULO PUBLICATIONS 22 Mar 2021
A) Introdução
No nosso anterior Update “Branqueamento de Capitais e Financiamento do Terrorismo: Fatores de Risco Reduzido e Elevado”, em que iniciamos a análise da Instrução 2/2021, de 26 de fevereiro ( “ Instrução n.º 2 /2021”), debruçamo-nos sobre os fatores de risco e tipos identificativos de risco de branqueamento de capitais ou de financiamento de terrorismo (“BCFT”), com que aquela Instrução complementou as listas de fatores e tipos identificativos, constantes dos Anexos II e III da Lei 83/2017 de 18 de agosto ( “Lei n.º 83/2017”).
Neste segundo Update, vamo-nos debruçar sobre as medidas simplificadas e reforçadas de identificação e diligência relativas às relações de negócio, transações ocasionais ou operações que as entidades financeiras devam aplicar, com as quais aquela Instrução pretende complementar as que já haviam sido previstas na referida Lei e no Aviso nº 2/2018, de 26 de setembro (“Aviso n.º 2/2018”).
B) Medidas Simplificadas
Quanto à aplicação de medidas simplificadas, as medidas previstas na presente Instrução não obstam às já previstas, quer na Lei n.º 83/2017, quer no Aviso n.º 2/2018.
Todavia, com este diploma, o BdP teve preocupação de concretizar o facto de que sempre que tenha lugar a aplicação de medidas simplificadas, a entidades financeiras devem continuar a acompanhar a deteção e operação não habituais ou suspeitas, com recurso a mecanismos que permitam verificar, numa base contínua, a manutenção de um risco comprovadamente reduzido de BCFT.
Na adequação ao grau do risco, sempre que a análise do risco propriamente dito, realizada à relação de negócio ou à transação ocasional, que justifique a necessidade de um maior conhecimento do cliente, do seu representante ou do beneficiário efetivo, as entidades visadas por este diploma, deverão requerer elementos e informações adicionais, em função do risco identificado, bem como, um nível de comprovação superior dos elementos identificativos e da informação obtida.
Note-se que, o alargamento dos serviços ou dos produtos prestados pelas entidades financeiras ao cliente, não obriga ao estabelecimento de uma nova relação de negócio, mas sim que haja pelas referidas entidades, uma adoção dos procedimentos de identificação e diligência, já previstos na Lei n.º 83/2017.
Por seu turno, na contratação dos serviços de iniciação do pagamento e de informação sobre contas, as entidades financeiras devem proceder à recolha e registo do nome do nome completo do cliente, ou denominação do cliente, dos respetivos representantes e beneficiários efetivos, com elementos identificativos, consoante sejam pessoas singulares ou pessoas coletivas.
Para as moedas eletrónicas, as entidades financeiras podem aplicar o regime acima descrito para a contratação dos serviços de iniciação do pagamento e de informação sobre contas, desde que se verifiquem cumulativamente, os seguintes pressupostos:
(i) os serviços prestados ao cliente, pela entidade financeira, circunscrevem-se a produtos de moeda eletrónica que cumpram a totalidade das condições de mitigação do risco especificadas no Anexo II do Aviso n.º 2/2018;
(ii) os fundos utilizados na aquisição ou carregamento do produto de moeda eletrónica terem origem numa conta domiciliada em entidade financeira, com sede ou estabelecimento num Estado-Membro da União Europeia ou em país terceiro no qual exista um quadro normativo e de supervisão, conforme o previsto na Lei n.º 83/2017 e no Aviso n.º 2/2018.
C) Medidas Reforçadas
Das medidas reforçadas previstas pelo BdP, optámos por destacar aquelas que incidem sobre os clientes, os seus representantes ou beneficiários efetivos, sobre os produtos, serviços, operação ou canal de distribuição, sobre serviços de private banking e por último, sobre alocalização geográfica.
Para efeitos de obtenção de informação adicional sobre clientes, os seus representantes ou os beneficiários efetivos, bem como sobre as operações planeadas ou realizadas, consideram-se medidas concretas de obtenção de informação adicional, a recolha de informação propriamente dita sobre:
(i) a origem e legitimidade do património;
(ii) a legitimidade dos fundos envolvidos na relação de negócio;
(iii) a reputação dos mesmos;
(iv) os membros próximos da família e pessoas reconhecidas como estreitamente associadas;
(v) as atividades anteriormente desenvolvidas;
(vi) o número, a dimensão e a frequência das transações que se estimam realizar no âmbito da relação de negócio.
Note-se que, para efeitos da verificação da origem do património, o regulador previu que as entidades visadas por este diploma, devem socorrer-se dos seguintes meios comprovativos:
a) declarações de rendimentos e, quando aplicável, de controlo da riqueza;
b) relatórios de demonstrações financeiras ou certificação de contas elaborados por auditores independentes;
c) recibos de vencimento;
d) certidões extraídas de registos públicos;
e) documento comprovativo de aquisição sucessória; e
f) informação pública, incluído a proveniente de órgãos de comunicação social, desde que de fonte independente e credível.
Se, nas situações em análise, classificadas como de risco acrescido, em que os clientes, os representantes ou beneficiários efetivos apresentem algum elemento de conexão com outras jurisdições, as entidades financeiras deverão obter pelo menos, requerer informação sobre as relações que os mesmos tenham com as referidas jurisdições e nos casos em que tenham sede ou domicilio outra jurisdição, o motivo pelo qual se pretende estabelecer uma relação de negócio ou realizar uma transação ocasional, fora da sua jurisdição de origem.
Quanto a produtos, serviços, operação ou canal de distribuição, sempre que se identifiquem uma situação de risco, as entidades financeiras devem ponderar a aplicação das seguintes medidas:
a) a limitação do número ou montante de operações permitidas;
b) a limitação da utilização a determinadas jurisdições;
c) a limitação da utilização a determinadas tipologias de clientes;
d) a limitação ou restrição da realização de operações em numerário;
e) a exigibilidade da realização de operações de depósito, carregamento, resgate ou reembolso através de meio rastreável, nomeadamente através de conta aberta junto de entidade financeira ou outra legalmente habilitada que, não se situando em país terceiro de risco elevado, comprovadamente aplique medidas de identificação e diligência compatíveis com as previstas, quer na Lei n.º 83/2017, quer no Aviso n.º 2/2018; e
f) a parametrização dos alertas, em função do risco atribuído ao produto, serviço ou operação, definindo e aplicando regras que permitam ajustar o risco do produto, serviço ou operação, ou quando associados a clientes de risco elevado.
No que concerne aos serviços de private banking, as entidades financeiras deverão, pelo menos, aplicar medidas reforçadas proporcionais aos riscos existentes, devendo adotar, pelo menos as seguintes medidas:
(i) a obtenção de informação adicional no cumprimento dos procedimentos complementares;
(ii) a intervenção de níveis hierárquicos mais elevados para a:
a) autorização do estabelecimento da relação de negócio, nos termos do disposto na alínea c) do n.º 6 do artigo 36.º da Lei n.º 83/2017; e
b) aprovação da avaliação de risco associada à relação de negócio e posteriores revisões.
(iii) a redução do intervalo temporal para a atualização da informação;
(iv) a monitorização do acompanhamento da relação de negócio;
(v) a reanálise do risco e demais elementos associados às relações de negócio, a que seja atribuído um grau de risco mais elevado, pelo menos uma vez por ano.
Por último, quanto à localização geográfica, sem prejuízo das medidas aplicáveis aos países terceiros de risco elevado, previstas na Lei n.º 83/2017, e das medidas aplicáveis às relações de grupo e estabelecimentos no estrangeiro, previstas no mesmo diploma legal, bem como no Regulamento Delegado (UE) 2019/758 da Comissão, de 31 de janeiro, sempre que identifiquem jurisdições associadas a um risco mais elevado de BCFT, relevantes para determinadas relações de negócio ou transações ocasionais, as entidades financeiras adotam as seguintes medidas:
a) a obtenção de informação adicional sobre a jurisdição em causa, nomeadamente sobre o quadro normativo relevante e a existência de supervisão compatível, quer com o previsto na Lei n.º 83/2017, quer com o Aviso n.º 2/2018;
b) a intensificação da profundidade ou da frequência dos procedimentos de monitorização, em conformidade com a Lei n.º 83/2017, tendo em consideração a origem e destino das transações.
Luísa Cabral Menezes | lcm@servulo.com