As Novas Sociedades de Investimento e Gestão Imobiliária – SIGI
SÉRVULO PUBLICATIONS 04 Feb 2019
1. Enquadramento geral
A aprovação pelo DL n.º 19/2019, de 28 de janeiro, do regime das Sociedades de Investimento e Gestão Imobiliária (as SIGI) corresponde a uma novidade muito esperada e justamente celebrada. A figura nacional mimetiza os traços gerais dos Real Estate Investment Trusts (REITs), dando corpo a uma sociedade-veículo para investimento imobiliário, com o capital disperso em mercado e forçada a uma política generosa de distribuição de dividendos. A única diferença em relação ao paradigma encontrado em mercados estrangeiros reside nos benefícios fiscais usualmente associados aos REITS, para maior atração da figura, que não encontram reflexo algum no regime das SIGI portuguesas.
As SIGI são sociedades anónimas com o capital mínimo de €5.000.000, emitente de ações que devem ser admitidas ao mercado regulamentado ou a um sistema multilateral de negociação, no prazo de um ano desde o registo comercial da sua constituição ou da conversão em SIGI abaixo tratada.
O principal objeto social das SIGI é o seguinte:
a) A aquisição de direitos de propriedade, de direitos de superfície ou de outros direitos com conteúdo equivalente sobre bens imóveis, para arrendamento ou para outras formas de exploração económica;
b) A aquisição de participações em outras SIGI, ou em sociedades com sede noutro Estado membro da União Europeia ou do Espaço Económico Europeu que esteja vinculado a cooperação administrativa no domínio da fiscalidade equivalente a? estabelecida no âmbito da União Europeia, que preencham cumulativamente os seguintes requisitos: i) Tenham um objeto social equivalente ao das SIGI; ii) A composição do seu ativo respeite os limites legais; iii) Tenham o capital social integralmente representado por ac?o?es nominativas; e iv) Estejam sujeitas a um regime similar ao previsto no artigo 10.º quanto a? distribuição de lucros;
c) A aquisição de unidades de participação ou de ac?o?es de: i) OII constituídos ao abrigo do RGOIC, e por este regidos, cuja política de distribuição de rendimentos seja similar a? estabelecida para as SIGI; ii) Fundos de investimento imobiliário para arrendamento habitacional e de sociedades de investimento imobiliário para arrendamento habitacional, cuja política de distribuição de rendimentos seja similar a? estabelecida para as SIGI.
2. SIGI vs SIMFE
Uma primeira apreciação desta nova figura não pode prescindir da sua comparação com as SIMFE (sociedades de investimento mobiliário para fomento da economia), criadas pelo DL n.º 77/2017, de 30 de junho, dado que ambas representam instrumentos societários forjados para a revitalização do investimento apoiado em empresas cotadas. As SIGI são vocacionadas para o investimento imobiliário, ao passo que as SIMFE se dirigem ao investimento em ações e dívida de longo prazo emitidas por PMEs. Em alguns pontos decisivos, a comparação revela um certo favor para a figura mais recente: as SIGI não são organismos de investimento coletivo, contrariamente às SIMFE; não têm duração mínima, o que contrasta com os 10 anos mínimos de duração das SIMFE; revelam maior capacidade de endividamento (60% do valor do ativo total da SIGI, o que compara com o limite de 10% sobre o capital nas SIMFE); o capital social das SIMFE deve ser admitido em mercado regulamentado ao final de um ano, ao passo que as SIGI podem ser admitidas em mercado regulamentado ou em sistema de negociação multilateral; os membros dos órgãos sociais das SIMFE devem cumprir requisitos de idoneidade, qualificação e experiência profissional e disponibilidade, o que não encontra paralelo no regime das SIGI. Por seu turno, como traços de sinal contrário, a política de dividendos é mais exigente para as SIGI, que – ao invés das SIMFE - não estão isentas do regime das OPAs obrigatórias quando revistam a natureza de sociedades abertas. Por fim, ambas as sociedades são supervisionadas pela CMVM, adotando um modelo de supervisor único (“one stop shop”) com comprovadas vantagens e dotado de potencial para ser estendido a outras instituições financeiras reguladas.
3. Conversão
Este novo regime prevê a possibilidade de outras entidades preexistentes se converterem em SIGI, a saber:
a) Sociedades anónimas:
A conversão em SIGI pode operar mediante deliberação da assembleia geral, tomada pela maioria de votos exigida para deliberar a alteração do contrato de sociedade. A conversão produz efeitos no 1.º dia do período de tributação após a data do registo das alterações ao contrato de sociedade.
b) Organismos de investimento imobiliário (OII) sob forma societária:
Os OII sob forma societária, constituídos ao abrigo do RGOIC, podem, igualmente, converter-se em SIGI, sendo necessária, para o efeito, uma deliberação da assembleia geral, aprovada pelos votos correspondentes a 90% do capital social do OII.
A deliberação de conversão e o contrato de sociedade alterado devem ser enviados, de imediato, à CMVM, sendo a deliberação imediatamente objeto de divulgação (no sistema de difusão de informação da CMVM, no sítio da Internet do OII ou da entidade responsável pela sua gestão). A conversão produz efeitos na data prevista na deliberação, determinando, assim, a caducidade da autorização do OII.
4. Composição do Ativo
O ativo das SIGI deve ser composto maioritariamente por:
i. direitos de propriedade;
ii. direitos de superfície; ou
iii. outros direitos de conteúdo equivalente sobre imóveis, para arrendamento ou para outras formas de exploração económica.
Aplicam-se, no entanto, os limites cumulativos seguintes:
a) O valor dos direitos sobre bens imóveis e participações deve representar pelo menos 80% do valor total do ativo da SIGI;
b) O valor dos direitos sobre bens imóveis objeto de arrendamento ou de outras formas de exploração económica deve representar pelo menos 75% do valor total do ativo da SIGI.
Estes requisitos de composição do ativo devem verificar-se a todo o tempo, a partir do segundo ano após a constituição da SIGI.
A titularidade de cada um dos direitos e das participações deve ocorrer durante um prazo de 3 anos a contar da data da sua aquisição.
5. Distribuição de Rendimentos
A lei prevê que as SIGI devam distribuir dividendos, nos nove meses seguintes ao encerramento de cada exercício, um valor mínimo correspondente a:
a) 90% dos lucros do exercício que resultem do pagamento de dividendos e rendimentos de ações ou de unidades de participação distribuídos por sociedades imobiliárias, OII ou fundos de arrendamento habitacional em que invistam; e
b) 75% dos restantes lucros do exercício distribuíveis nos termos do CSC.
As SIGI têm uma obrigação de reinvestimento de pelo menos 75% do produto líquido da alienação de ativos afetos à prossecução do seu objeto social principal, noutros ativos destinados à prossecução de tal objeto, no prazo de três anos a contar da referida alienação.
Outra limitação decorrente deste regime prende-se com o valor da reserva legal das SIGI, que não pode exceder 20% do capital social, não podendo ser constituídas outras reservas indisponíveis.
Este novo regime jurídico das SIGI entrou em vigor no passado dia 1 de fevereiro de 2019.
Paulo Câmara
pc@servulo.com
Sofia Thibaut Trocado
stt@servulo.com