Alteração do Regime de Entrada, Permanência, Saída e Afastamento de Estrangeiros (REPSAE)
SÉRVULO PUBLICATIONS 25 Aug 2022
A Lei n.º 18/2022, de 25 de agosto, que entra em vigor no dia 26 de Agosto, veio alterar a Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, relativa ao Regime de Entrada, Permanência, Saída e Afastamento de Estrangeiros do território nacional (doravante REPSAE)[1].
Esta alteração pretende facilitar o processo de obtenção de vistos, com as finalidades de “atrair uma imigração regulada e integrada, para o desenvolvimento do País, mudar a forma como a Administração Pública se relaciona com os imigrantes e garantir condições de integração dos imigrantes” e “de se alcançarem os objetivos consagrados no Acordo”[2] sobre a Mobilidade entre os Estados-Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), sendo as suas alterações mais relevantes:
- Criação do “visto para procura de trabalho” e simplificação do visto de residência para trabalho;
Este visto, previsto no novo artigo 57.º-A, válido por 120 dias, habilita o seu titular a entrar e permanecer no território nacional para procurar trabalho bem como a exercer atividade laboral dependente, desde que cumprindo os requisitos gerais para obtenção de visto. Pode ser prorrogado por mais 60 dias, exige título de transporte que assegure o regresso (de acordo com o artigo 52.º, n.º 2, na sua nova redação) e apenas é válido para território português.
Integra uma data – dentro do prazo de 120 dias – de agendamento no Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), para requerer uma autorização de residência temporária, cujo direito é concedido após constituição e formalização da relação laboral, nos termos gerais (cf. artigo 77.º).
Caso o limite máximo de validade do visto termine sem que tenha sido constituída uma relação laboral e iniciado o processo de regularização documental subsequente, o cidadão tem de abandonar o país e apenas pode fazer um novo pedido de visto para este fim após um ano.
Aos titulares do visto para procura de trabalho que constituam relação laboral, dentro da validade do visto, serão aplicadas algumas das regras aplicáveis ao visto de estada temporária (cf. artigos 56.º-A, n.º 1, alínea b) e n.º 2, 56.º-B, n.os 1 e 2, artigos 56.º-C a 56.º-G), no que concerne ao indeferimento e cancelamento do visto, bem como a procedimentos e garantias processuais.
Além disso, no que toca ao visto de residência para exercício de atividade profissional subordinada, são revogados os números 1 a 3 e 6 a 9 do Artigo 59.º do REPSAE. Assim, desde que um cidadão preencha os requisitos gerais necessários à obtenção de qualquer visto, e que tenha uma promessa ou contrato de trabalho, ou manifestação individualizada de interesse de uma entidade empregadora, terá direito a este visto de residência.
Esta alteração à Lei n.º 23/2007 desonera os cidadãos da obrigação de celebração um contrato de trabalho ou promessa de contrato de trabalho antes da sua entrada em território português e, igualmente, desonera os empregadores de terem que disponibilizar uma oferta de trabalho junto do IEFP pelo período 30 dias, quando tencionam contratar um cidadão estrangeiro em concreto.
No mesmo sentido, no que concerne à concessão de vistos para o exercício de atividade profissional independente, desaparece a exigência da anterior redação do artigo 60.º, referente a vistos de residência, que o cidadão estrangeiro requerente tivesse, de antemão, celebrado um contrato de prestação de serviços ou fosse destinatário de proposta contratual.
É de notar que estas alterações deixam intocado o mecanismo, já previsto na lei, de solicitação de autorização de residência com dispensa de visto, já após a entrada do cidadão estrangeiro em território português, mediante manifestação de interesse. Para o efeito é necessário que o cidadão estrangeiro tenha entrado legalmente em Portugal e iniciado uma atividade laboral subordinada ou independente (de acordo com os artigos 77.º, 88.º e 89.º). Contudo, trata-se de um processo muito demorado, podendo durar vários anos e se o cidadão sair de Portugal na pendência do mesmo, poderá não ser autorizado a voltar a entrar no país. Do mesmo modo, ao exigir-se que o cidadão tenha entrado legalmente em Portugal (artigos 88.º, n.º 2, alínea b) e 89.º, n.º 2), presumindo-se que tal tenha sucedido sempre que trabalhe em território nacional e tenha a sua situação regularizada perante a segurança social há pelo menos 12 meses, a manifestação de interesse e consequente autorização de residência pode, na prática, revelar-se difícil, ao que se soma o tempo total que pode demorar a obter a autorização.
É, assim, previsível, que com a entrada em vigor das alterações em análise, a manifestação de interesse passe a ser um mecanismo menos solicitado, dada a possibilidade de outras opções mais simples e céleres para obter autorização de residência em Portugal.
- Criação do “visto de residência para o exercício de atividade profissional prestada de forma remota para fora do território nacional”;
É concedido aos trabalhadores subordinados e profissionais independentes para o exercício de atividade profissional prestada, de forma remota, a pessoas singulares ou coletivas com domicílio ou sede fora do território nacional.
O novo artigo 61.º-B prevê esta situação relativamente à concessão de vistos de residência e o artigo 54.º, n.º 1, alínea i) relativamente aos vistos de estada temporária.
No regime anteriormente vigente, as soluções mais próximas desta realidade eram os vistos (de residência e de estada temporária) relativos a trabalho independente, os quais pressupunham a prestação de serviços a pessoas singulares ou coletivas com domicílio ou sede dentro do território nacional, e o visto D7, um visto de residência para fixação de pessoas que vivem de rendimentos próprios (como rendas, alugueres, rendimentos provenientes de investimentos financeiros ou reformas).
Esta alteração vem acautelar a situação dos chamados “nómadas digitais”, estilo de vida e de trabalho cada vez mais implementado e que, até hoje, não encontrava o devido tratamento.
- Criação da “autorização de residência para cidadãos da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa”;
Aplicável a quem seja cidadão de um Estado com Acordo CPLP e tenha entrado legalmente em território nacional. Pressupõe as condições de concessão de visto de residência e autorização de residência CPLP.
No âmbito do novo Acordo de Mobilidade da CPLP, preveem-se condições especiais de concessão de vistos a cidadãos nacionais de Estados Membros da CPLP, nos termos do novo artigo 52.º-A:
- O parecer prévio do SEF é dispensado e os serviços competentes para a emissão do visto procedem à consulta direta e imediata das bases de dados do Sistema de Informação de Schengen (SIS).
- A recusa da emissão do visto só ocorre no caso de constar indicação de proibição de entrada e de permanência no SIS, ou se o cidadão for menor e não tiver autorização para viajar.
- A emissão do visto é automaticamente comunicada ao SEF.
- O visto de residência passa a poder ter como finalidade o acompanhamento de membro de família requerente de visto de residência.
Assim, nos termos do novo n.º 5 do artigo 58.º, deixa de ser necessário, para reagrupamento familiar, que o membro da família que se encontra em Portugal tenha já obtido a autorização de residência, passando a ser suficiente que o tenha requerido.
- Emissão de pré-autorização de residência.
Com a emissão do visto de residência, passa a ser emitida uma pré-autorização de residência na qual consta a informação relativa à obtenção de autorização de residência e a atribuição provisória de Número de Identificação Fiscal (NIF) e Número de Identificação da Segurança Social (NISS), nos termos do novo n.º 6 do artigo 58.º;
É expectável e desejável que as alterações introduzidas venham a resultar na diminuição dos casos de fraude à lei neste âmbito, devido à facilitação dos procedimentos regulares.
Inês Nabais do Paulo | inp@servulo.com
Juliana Figueiredo dos Reis
[1] Todos os artigos que não tenham referência expressa ao respetivo diploma legal estão integrados no Regime de Entrada, Permanência, Saída e Afastamento de Estrangeiros.
[2] Cfr. preâmbulo da Lei n.º 18/2022, de 25 de Agosto.